segunda-feira, 11 de setembro de 2017

O Conflito Israelo-Árabe 18, 19, 20 e 21

Sim. É mesmo a única democracia consolidada do Médio Oriente. Em Israel há liberdade de expressão, uma grande variedade de órgãos de informação, uma miríade de partidos políticos, um parlamento representativo e um governo que os cidadãos podem facilmente destituir caso estejam descontentes, o que já aconteceu inúmeras vezes. As minorias, incluindo a minoria árabe, tem direitos políticos e também está representada no parlamento, o Knesset.


Nas primeiras décadas após a independência a política israelita foi dominada pelos trabalhistas, mais ligados aos ashkenazi, que dispuseram de confortáveis maiorias de governo. A partir da década de 1970 a direita do Likud, partido mais ligado aos sefarditas, passou a ganhar regularmente as eleições, tendo desde então havido alternância entre primeiros-ministros trabalhistas e do Likud, tendo mais recentemente surgido um terceiro partido centrista, o Kadima que chegou a fazer eleger primeiros-ministros.


O sistema político está contudo muito pulverizado, pois a lei eleitoral não favorece a concentração de votos e têm-se multiplicado os pequenos partidos com uma base religiosa ou étnica (ligados, por exemplo, às comunidades de origem russa) ou ainda representando interesses particulares (pensionistas, habitantes dos colonatos). Isso torna não só muito difícil formar maiorias no Knesset, onde há 12 partidos representados, como obriga a compromissos que tendem a paralisar a acção política.

Dificilmente, apesar de já terem ocorrido eleições. Na Faixa de Gaza domina o Hamas que, em 2007, assumiu o controlo daquela região sobrepovoada e dela expulsou os seus rivais da Fatah. Na Cisjordânia o poder é controlado pela Fatah, a facção que era originalmente de Yasser Arafat e é a dominante na OLP. Esta divisão ocorreu depois de o Hamas ter ganho as eleições legislativas de 2006 mas não se ter conseguido entender com a Fatah para uma partilha do poder – a Presidência da República está nas mãos da Fatah, que em 2005 elegera para o cargo Mahmoud Abbas, o sucessor de Arafat.

Depois da guerra civil que levou à separação entre Gaza e a Cisjordânia nunca mais se realizaram eleições. O mandato de Mahmoud Abbas, por exemplo, terminou em Janeiro de 2009, mas tem vindo a ser sucessivamente prorrogado. Quanto ao Parlamento, as primeiras eleições tiveram lugar em 1996 e foram boicotadas pelo Hamas. Só voltou a haver eleições em 2006, e nessa altura ganhou o Hamas, o conduziu à guerra civil Hamas-Fatah. Desde então não houve mais eleições.

Para além disso, nos territórios sob jurisdição da Autoridade Palestiniana não existe verdadeira liberdade de imprensa; os direitos das mulheres não são respeitados; e ocorrem com frequência execuções sumárias.

O princípio das negociações de Oslo que levaram ao histórico acordo israelo-palestiniano de 1993 foi o da troca de terra por paz: Israel devolvia à Autoridade Palestiniana, de forma progressiva, a soberania sobre Gaza e a Cisjordânia em troca do reconhecimento da sua existência. A prazo deveria nascer nos territórios entregues à Autoridade Palaestiniana um novo Estado que pudesse viver em paz com Israel.


Este plano sempre contou com ferozes opositores dos dois lados do conflito. Em Israel opuseram-se-lhe quer os que defendem um Grande Israel, e por isso não abdicam de uma fronteira que passe pelo vale do Jordão, quer os que receiam, por questões de segurança, a vizinhança de um Estado palestiniano com soberania plena.

Do lado palestiniano opõem-se-lhe todos os que continuam a não reconhecer o direito à existência do Estado de Israel. É essa a posição tradicional do Hamas, por exemplo.

De acordo com sondagens realizadas tanto em Israel como nos territórios é esta a solução desejada pela maioria tanto de israelitas como de palestinianos.

A solução de um único Estado parece inviável. Uma fusão pacífica que juntasse todos os que vivem no antigo espaço da Palestina do mandato britânico criaria um Estado de maioria árabe e representaria o fim da ideia de um Estado judeu, e é duvidoso, para não dizer altamente improvável, que pudesse funcionar em paz e democracia. A alternativa – um Estado judeu do Mediterrâneo ao Jordão – implicaria, para ter viabilidade, a expulsão de centenas de milhar de palestinianos ou a sua manutenção como cidadãos de segunda, sem direitos políticos, o que ninguém na comunidade internacional aceitaria.

Existe, apesar de ser um problema com contornos sobretudo políticos.

Na sequência da guerra da independência de Israel, em 1948, cerca de 700 mil palestinianos fugiram de suas casas, ou foram forçados a abandoná-las. Esses palestinianos espalharam-se pelos países da região, tendo sido construídos campos de refugiados no sul do Líbano, na Cisjordânia, na Jordânia e na Faixa de Gaza. Muitos desses campos ainda hoje existem, mesmo quando à vista desarmada pouco ou nada os diferencia de um bairro pobre.

2003
Porque é que, passados quase 70 anos, esta situação se mantém?
Primeiro, porque os países árabes da região, com a excepção parcial da Jordânia, nunca aceitaram integrar esses refugiados, da mesma forma que não aceitaram aceitar a própria existência de Israel. Depois porque desde a primeira hora que os palestinianos reivindicam o chamado “direito de retorno”, isto é, o direito a reocuparem as casas e as terras que abandonaram precipitadamente em 1947 e 1948. 

O “direito de retorno” tornou-se mesmo num dos mais delicados temas, e num dos mais difíceis, do processo de paz israelo-palestiniano, e as chaves das antigas casas abandonadas são hoje um símbolo muitas vezes agitado para efeitos mediáticos pelos descendentes dos refugiados originais.

Israel argumenta que o problema dos refugiados só existe porque os países árabes não quiseram integrar os palestinianos deslocados, ao contrário do que fez Israel, que acolheu e integrou centenas de milhar de judeus que, depois da independência, saíram ou foram obrigados a sair dos países árabes onde viviam há muitos séculos, nalguns casos há dois milénios. Israel também sabe que o retorno dos descendentes dos refugiados alteraria de forma dramática a composição demográfica do país, ameaçando a sua natureza de Estado judaico.

No século XX, na Europa e no Médio Oriente, houve inúmeros casos de guerras que terminaram com a deslocação forçada de populações – foi o que sucedeu, por exemplo, na sequência da guerra entre a Turquia e a Grécia; foi o que sucedeu aos alemães dos Sudetas e da Polónia Ocidental; foi o que se passou com o sérvios da Krajina. Houve também gigantescas transferências de populações no Punjab, quando a Índia se separou do Paquistão. 


A permanência de um estatuto de refugiado para uma massa tão grande de deslocados de há mais de seis décadas, quase três gerações, é por isso um caso único nas relações internacionais.




O essencial para entender 
o conflito israelo-palestiniano
José Manuel Fernandes
Observador – 14 de Julho de 2014

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